Mais “policiamento” ou mais investigação?

Nesses tempos de violência sem fim, é comum ouvirmos – sobretudo por meio de reportagens veiculadas pela imprensa escrita ou televisionada – pedidos por “mais policiamento”. Clamor esse, não raro, proveniente de quem que acabou de sentir na pele o total desleixo do Estado para com a Segurança Pública.

Apesar de esperado, e de compreensível (até certo ponto), se atendido, o pedido por “mais policiamento” mudaria algo em nosso contexto de (in)Segurança Pública? Como alguém que atua há 12 anos na área, arrisco-me a responder de plano: não! Não mudaria quase nada! 
Explico: em primeiro lugar, é importante registrar que “mais policiamento” significa mais viaturas caracterizadas e mais policiais fardados em nossas vias públicas. Em outros termos, mais policiais militares, uma vez que cabe à Polícia Militar (PM) o policiamento preventivo/ostensivo. Nesse momento, o leitor poderia questionar com aquela velha frase de que “prevenir é melhor que remediar”. Enfim, poderia. Porém, quando o assunto é Segurança Pública, a questão não é assim tão simples.

Começando: para alguns crimes sim, há considerável redução quando de uma presença policial mais intensa (roubos a transeuntes e de veículos, por exemplo). Para outros, entretanto, essa presença não surte o mesmo efeito. Como exemplos, lembro da violência contra a mulher, que, em regra, ocorre no âmbito familiar; e também do homicídio, cujo autor pode perfeitamente esperar a viatura afastar-se, para tranquilamente atentar contra a vida de seu alvo.

Ora, se não é correto pedir por “mais policiamento”, o que a sociedade de cobrar daqueles que têm poder de decisão? Primeiramente, não nego a importância da Polícia Militar no contexto da Segurança Pública. Entretanto, reforço que atividade preventiva não é, nem perto, suficiente por si só. E é nesse momento, que trago como imperativa, a necessidade de o cidadão reconhecer e começar a clamar também por uma Polícia Civil mais forte e melhor estruturada.

Isso porque de nada adianta uma guarnição policial militar prender algum suspeito, conduzi-lo à Central de Flagrantes – hoje na Capital, apenas uma (!) – para a lavratura do flagrante, e ficar aguardando numa fila (composta de outras guarnições) por horas e horas. E nesse período, quem faz o tão desejado “policiamento” nos bairros? Em algumas situações, ninguém! Em outros termos, a existência de mais escrivães e de mais delegados de polícia surte efeito direto na segurança de cada cidadão, incluindo no tão badalado “policiamento”!

Além disso, de nada adianta a lavratura de um flagrante, se depois, pelo reduzido efetivo de agentes de polícia, as investigações não puderem avançar. Toda investigação policial é complexa e demanda tempo e dedicação. Mas como investigar sem tempo (e sem condições estruturais), por mais que haja amor pela profissão?!

Da mesma forma, de nada adianta todo o trabalho acima, se os vestígios resultantes do crime se perderem! Vestígios esses, que muitas vezes, acabam mesmo se esvaindo, uma vez que os efetivos da Polícia Técnico-Científica (o que inclui peritos criminais, médicos legistas, fotógrafos criminalísticos, auxiliares de autópsia, entre outros) são insuficientes para toda a demanda de perícias necessárias e relacionadas às investigações em andamento.

O resultado disso todos sabemos: inquéritos policiais que se arrastam por meses ou anos; sem falar naqueles que, uma vez no Judiciário, acabam por resultar em condenações brandas; ou pior, em absolvições por falta de provas. E adivinhem só, quando isso acontece, são mais criminosos nas ruas para aterrorizarem ainda mais a população, e para sobrecarregarem mais ainda todas as Polícias. 

Por fim, reitero que é hora de a sociedade voltar seus olhos para o sistema como um todo, e não apenas para as viaturas que patrulham nossas ruas. É fato que são inúmeros os problemas nos demais pontos desse sistema (como uma legislação pró-criminalidade, um Judiciário abarrotado de processos, e um sistema prisional carente de vagas e também de estrutura).

Ainda assim, fazendo a nossa parte – ainda no âmbito policial – acredito que algum alento pode ser dado à sociedade, ainda que muito mais precise ser feito. Isso claro, desde que tenhamos, tanto na Polícia Civil quanto na Técnico-Científica, um mínimo de respaldo e de estrutura.

Ricardo Matos
Perito Criminal de 1ª Classe (Filiado – SINPOL-GO)

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